quinta-feira, 9 de novembro de 2017

O caminho da roça


por Roberto Tranjan

Olá Pessoal,

Se você tem um pé lá no sertão, sabe que o caminho da roça é aquele que torna mais fácil o trajeto de um lugar a outro. Até mesmo os habitantes das cidades, que nunca foram para o interior, têm sua própria versão dele – as ruas que todo mundo escolhe para ir e vir, por isso, mesmo sempre congestionadas. Trilhar o caminho da roça traz a garantia de alcançar o destino desejado no tempo certo. Não traz novidades, é certo, nem permite grandes descobertas. Apenas está lá, disponível para todos, e a maioria prefere segui-lo ao invés de qualquer outro.

O mercado, também é assim: repleto de “caminhos da roça”. São os vários trajetos percorridos todos os dias pelas mesmas empresas, do mesmo jeito, e que produzem sempre os mesmos resultados. Diante de uma mata imensa, repleta de espaços virgens, intocados, o caminho da roça parece ser o percurso óbvio. E quando alguém se arrisca a embrenhar-se pelo desconhecido em torno, em busca de alternativas, logo os demais tratam de lembrar à pessoa incauta da existência do caminho da roça. Afinal, o caminho da roça lá está para simplificar a vida e descomplicar os movimentos, evitar os perigos, pasteurizar as criaturas. É seguro e confortável. Mas não combina nem um pouco com o famigerado discurso em prol da criatividade e da inovação.

Verdadeiramente, o caminho da roça facilita a vida, mas se não nos aventurarmos por outros trajetos, passa a ser a única possibilidade. O caminho da roça é um facilitador e, ao mesmo tempo, um limitador de idéias e iniciativas. Toda vez que tentamos um trajeto novo, os registros mentais insistem em nos levar de volta para o caminho da roça.


Enganar a mente

O que fazer diante disso? Continuar trilhando o confortável caminho da roça traz visibilidade (afinal, dá para seguir com os olhos fechados, tão previsíveis todos os passos) e a ilusão da segurança, mas impede a construção de uma nova história e a criação de um negócio único. Então, é necessário, vital mesmo! Ousar, em busca de opções. Mas, para isso, é preciso “enganar” os nossos registros mentais. Existem algumas técnicas que funcionam como estímulos para enxergar outros e diferentes caminhos. Permitem criar um novo contexto e uma nova perspectiva e sair, nem que seja por breves períodos, do tradicional caminho da roça. Nessas escapadas podemos ter idéias que nos levarão a fazer novas conexões com outros caminhos.


Reformular o problema

Um dos exercícios para essa difícil virada é descrever o problema de uma maneira diferente e preparar a mente para abordá-lo de um modo inovador. Exemplo: um edifício de escritórios sofria com um elevador cronicamente lento. A administração chamou os especialistas para avaliar a estrutura. Eles chegaram à conclusão de que trocar o elevador por um novo modelo, mais rápido, exigiria a demolição e reconstrução de uma grande parte da estrutura construída, uma opção financeiramente inviável.

Reformularam, então, a perspectiva do problema: os inquilinos estão aborrecidos porque têm de esperar muito tempo, na entrada. Essa sutil mudança alterou o foco, levando a uma alternativa que se mostrou especialmente adequada, a um custo baixíssimo. A solução foi contratar marceneiros para instalar um grande espelho no saguão do elevador.

Em vez de se concentrar no visor e na expectativa de pronta chegada do elevador, as pessoas passaram a ocupar o tempo disponível na tarefa de observar sua própria imagem. Passaram a fazer – sem nenhum estresse – ligeiras correções, como ajeitar o cabelo e um detalhe ou outro da roupa, melhorando sua aparência.

Resultado: o volume de queixas baixou consideravelmente. E tudo graças à redefinição do problema: em vez de “o elevador é muito lento”, para “as pessoas estão chateadas”. Tratava-se, portanto, de procurar o que fazer para acabar ou reduzir com a situação desconfortável. Outras idéias: deixar a escadaria atraente e dar início a uma campanha de vida saudável para estimular os inquilinos a subir pela escada colocar poltronas e bancos pelo saguão para que as pessoas esperem com mais paciência alternar os horários de entrada e saída dos escritórios para aliviar o engarrafamento.

Quando o foco no produto e nos seus atributos é substituído pelo foco no cliente e suas necessidades, a imaginação corre solta. Experimente!


Fazer analogias

Trata-se de buscar um mundo correlato e aproveitar as experiências de outras pessoas ou outros ramos de atividade. Voltar-se para outras áreas, nelas buscando inspirações e respostas, é um jeito legítimo de romper bloqueios e buscar o pensamento divergente. Foi assim que inventaram o desodorante roll-on: quando alguém olhou para a caneta esferográfica e fez a conexão.

Tudo o que precisa ser feito é perguntar: “onde, no mundo, o meu desafio (ou algo parecido) já foi enfrentado?” Se você quer resolver um problema de velocidade, talvez o McDonalds e a Fórmula 1 sejam inspiradores.


Mudar o ângulo

Trata-se de desafiar as regras, a forma tradicional de pensar. Existe uma pergunta que provoca o status quo e remete ao pensamento divergente: “e se…?”
Exemplos: e se não fizermos nada? E se fizéssemos isso pela metade do custo? E se os consumidores comprassem duas vezes mais? E se mudássemos o processo? E se exagerássemos?

Usar o “e se…” é uma forma de desafiar as regras e suposições que fixam os caminhos da roça. Mudar o ângulo permite enxergar caminhos virtuais estimulados por provocações do tipo: o que poderia ser substituído? O que poderia ser combinado? O que poderia ser ampliado ou reduzido? O que mais o seu produto ou serviço poderia ser? O que poderia ser eliminado?


Buscar conexões inusitadas

O que tem a ver uma fábrica de carros com um frigorífico de abate de boi? A princípio, nada. Mas Henry Ford, observando o processo de abate de bois, criou, no sentido contrário, o sistema de produção em série e de montagem de veículos.
O que tem a ver carrapichos com fechos de vestuários? A princípio, nada. Mas George de Mestral, observando as centenas de ganchinhos dos carrapichos, inspirou-se para criar os fechos de velcro.


Óculos emprestados

Os estímulos em si não criam as idéias, mas ajudam a instigar a imaginação. Melhor ainda quando o exercício é feito em equipe. Se você combinar as suas idéias com as dos outros, terá idéias que nunca teve antes.

A troca é necessária! Todos nós temos os nossos pontos cegos, aquilo que não conseguimos enxergar. É salutar pedir os “óculos” dos outros emprestados. Há, nesse movimento, um sentido de compartilhamento e criação conjunta que pode ser, além de efetivo, muito gratificante. Todos nós temos um conjunto de inteligências que se somam às inteligências de outras pessoas. Se você não tem todo o conhecimento e experiência que necessita, junte-se a alguém que tem. A maior de todas as inteligências é pedir e aceitar ajuda.

Dois cavalos puxando, juntos, a mesma carroça podem mover mais do que a soma do peso que cada um é capaz de mover individualmente. Esse fenômeno recebe o nome de sinergia. É isso que acontece quando as pessoas pensam juntas.

Para praticar a sinergia, no entanto, há que acreditar na cooperação: valorizar as pessoas, valorizar as suas idéias (rejeitar uma idéia é rejeitar a pessoa que a teve) e valorizar o trabalho em equipe. E, sobretudo, acreditar que todos podem contribuir para a evolução do negócio, não apenas os empreendedores e o pessoal de primeiro escalão. Para tanto, o respeito ao ser humano é o ponto de partida. E, também, a confiança.

Por fim, é necessário dar tempo às idéias. É comum colocar a idéia no banco dos réus: o objetivo dos jurados é descobrir onde está o furo, onde falta lógica.

Suspenda o julgamento! As idéias precisam ganhar força e tamanho. Precisam ser cultivadas. Somente assim seremos capazes de nos desviar do caminho da roça e criar situações favoráveis às novas descobertas, novos caminhos, novas histórias e novos resultados.

Imaginar pode ser a chave, milagrosa, para o êxito. Além de tornar a vida muito, mas muito mais interessante e divertida!

Pense nisso!